Controle máximo para risco mínimo

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Para utilizar uma substância ou planta como medicamento no Brasil é preciso obter aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), com dados comprovando sua segurança e eficácia. Uma portaria da Agência classifica a maconha e suas substâncias como proscritos, ou seja, proibidos no Brasil.

Com base nestas premissas, a Anvisa  deu parecer contrário à liberação do cultivo de maconha para fins medicinais em um documento protocolado no Supremo Tribunal Federal (STF). O documento é assinado por Thais Mesquita do Couto Araujo, especialista em Regulação e Vigilância Sanitária da agência. O texto é referendado pela gerente de Produtos Controlados da Anvisa, Renata de Morais Souza, e pelo diretor-presidente do órgão, Jarbas Barbosa.

Para o órgão, é preciso que haja uma regulamentação sobre o assunto por considerar perigoso liberar o plantio e cultivo, apontando até mesmo o risco de desvio do produto para uso recreativo.

A Agência afirma ainda que a regulamentação é necessária e deve levar em conta fatores como os efeitos da planta, cadastro e acompanhamento de pacientes, a segurança e acesso ao local de cultivo e qualidade do produto. O trabalho já está sendo tocado por um grupo da própria Anvisa que se reuniram com autoridades sanitárias de países como Israel, Canadá, Holanda, Chile e EUA para compartilhar experiências.

Outros órgãos públicos brasileiros, como Casa Civil da Presidência da República, Ministério da Justiça, Ministério da Saúde e Polícia Federal, também já foram contatados para ajudar na regulamentação.

O Partido Popular Socialista (PPS) propôs em maio deste ano, uma ação pedindo que o STF assegure “o plantio, cultivo, colheita, guarda, transporte, prescrição, ministração e aquisição de Cannabis (nome científico da maconha) para fins medicinais e de bem-estar terapêutico, mediante notificação de receita, conforme as normas de saúde pertinentes”. Na ação, o partido solicita ainda que, na ausência de regulamentação, seja dispensada autorização para o plantio e cultivo se o objetivo for médico ou de pesquisa científica.

Mas, segundo o documento da Anvisa , “não é possível isentar o processo da complexidade que lhe cabe, sob a pena de serem estabelecidos critérios e procedimentos que não protejam a saúde da população e garantam os controles necessários para se evitar o desvio de uso”. A Agência acrescenta ainda que a Cannabis é uma “planta com conhecida utilização indevida / recreativa, devendo-se garantir o acesso para fins científicos e medicinais de forma supervisionada e controlada, minimizando-se assim o risco à saúde e de desvio de uso”.

Os malefícios da droga e a necessidade de um controle rígido antes de se autorizar a pesquisa e o licenciamento de medicamento à base da erva são outros pontos de destaque no documento da Anvisa que listou ainda uma série de problemas de saúde associados à planta, como efeitos pulmonares, cardiovasculares e psiquiátricos, alertando que o “consumo generalizado da planta Cannabis sativa não processada pode levar a riscos consideráveis de saúde pública, incluindo esquizofrenia, psicose, dependência e os outros riscos mencionados neste documento. A aplicação terapêutica de compostos canabinoides específicos continuam sob pesquisa médica ativa. O que é bem conhecido é que há muitos riscos potenciais e efeitos adversos psiquiátricos da Cannabis fumada e seus derivados sintéticos”.

A Anvisa também destaca os efeitos da abstinência causados pelo uso da maconha “comparáveis ao vício à heroína. Se um adolescente ou adulto interrompe repentinamente o uso desta planta, uma evidente síndrome de abstinência pode ser desenvolvida, conforme reportado em vários estudos científicos. Os sintomas de abstinência incluem irritabilidade, ansiedade, agressão, transtornos do sono e inquietação”.

A agência destacou ainda que o Brasil é signatário de duas convenções internacionais que proíbem a erva e o uso do seu princípio ativo, o tetra-hidrocanabinol (THC), mas que permitem a produção, manufatura, exportação, importação, posse ou uso da planta para fins médicos e científicos, desde que sob controle e supervisão dos órgãos públicos.

Em 2014 a Anvisa autorizou a importação excepcional de medicamentos à base da canabidiol e em 2016 aprovou o Mevatyl, remédio à base de THC e canabidiol, para o tratamento de sintomas da esclerose múltipla. Mas ressaltou que é “importante esclarecer que esses produtos atualmente importados não são considerados medicamentos em seus países de origem e, portanto, não possuem avaliação de segurança e eficácia realizadas pelas autoridades sanitárias competentes”.

Em 30 de junho de 2017, a ministra Rosa Weber, relatora da ação no STF, deu dez dias para Presidência da República, o Senado Federal, a Câmara dos Deputados e a Anvisa se manifestarem. O debate prossegue, mesmo após a Anvisa protocolar seu parecer.

 

Fonte: O Globo