Eu só quero chocolate…

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Nascido no Rio de Janeiro em 28 de setembro de 1942, Sebastião Rodrigues Maia transformou-se num dos nomes mais importantes da música brasileira, influenciando uma geração de artistas com seu swing e poesia tão característicos: Tim Maia.

Como usuário de drogas o cantor também fez história.

A ele são atribuídas a autoria de diversas gírias relacionadas à maconha, a exemplo de “garrastazu”, criado pelo cantor durante o período da ditadura sob o comando do sanguinário presidente-general Garrastazu Médici. O termo servia para designar o esconderijo onde ele e seus amigos pudessem fumar maconha e, quem sabe, usar outras substâncias mais.

Outra pérola eternizada na obra do cantor faz referência a uma das variedades canábicas conhecida como haxixe. Na canção Chocolate, de 1971, Tim Maia exalta o creme do THC em versos como: “Não quero chá/ Não quero café/ Não quero Coca-Cola/ Me liguei no chocolate/ Eu me liguei!/ Só quero chocolate”.

O que o eterno síndico da soul music brasileira certamente não imaginou é que, 45 anos depois de lançar esta canção, o cacau se tornaria numa nova droga recreativa.

De acordo com o site de notícias americano Ozy, a substância tem sido usada em festas eletrônicas onde o consumo de bebidas alcoólicas não é permitido, como a Lucid, realizada mensalmente em Berlim, na Alemanha. De acordo com seus usuários, a ingestão de cacau – na forma de pílula, bebida e até mesmo via nasal – excita o cérebro e provoca sensação de energia e disposição.

Na Lucid, o cacau amargo balinês é servido em bebidas misturadas com mel, xarope de agave e canela. Já a Morning Gloryville, uma empresa que organiza festas nos Estados Unidos e na Europa, abastece seus bares com bebidas à base de cacau e com a substância em cápsulas. A forma mais curiosa — ou estranha — de consumir o cacau é via nasal. O produto em pó pode ser encontrado na loja do belga Dominique Persoone. Ele inventou um dispositivo que ajuda a “inalar” o alimento, além de ter criado uma mistura inédita da substância com menta e gengibre.

Segundo os defensores, o cacau cru, além de ser uma substância lícita em todas as partes do mundo, é muito mais potente do que se imagina. Ele desencadearia uma onda de endorfina na corrente sanguínea, aumentando a sensação de euforia. Em seguida, o cacau reduziria a tensão corporal ao promover o relaxamento muscular. Além disso, a substância é cheia de flavonoides que, de acordo com um estudo publicado recente no periódico científico American Journal of Clinical Nutrition, responsáveis por aumentar a circulação sanguínea e estimular o cérebro. Outra vantagem descrita pelos adeptos: ao contrário de outras drogas, o cacau não distorce a realidade. De acordo com Ruby May, organizadora da Lucid, ele apenas “amplifica” a experiência musical.

Por outro lado, segundo Catherine Kwik-Uribe, diretora de pesquisa e desenvolvimento da Mars Symbioscience, empresa de tecnologia dedicada ao desenvolvimento de produtos com base científica, embora o cacau puro contenha certos compostos que melhoram o humor, como a anandamida e feniletilamina, a quantidade deles na substância seria tão baixa que não teria qualquer influência direta sobre o humor. Ou seja, os efeitos “entorpecentes” citados seriam apenas um placebo.

Porém, de acordo com o endocrinologista Walmir Coutinho, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, existem estudos que apontam que a região do cérebro ativada com o consumo do chocolate é a mesma afetada em um dependente de cocaína. O alimento é tão eficiente em proporcionar prazer (e viciar), que, contam os registros históricos, já foi relacionado com forças ditas malignas pelos jesuítas, no século 16. Foi neste período que os maias utilizavam as favas de uma árvore chamada Theobroma cacao para preparar uma bebida saborosa e nutritiva chamada xocolatl. Acredita-se que o nome conhecido nos dias atuais provavelmente se origine daí.

Mas, não, o Tim não se chama Maia por isso. Desta história toda, ele só queria mesmo era chocolate.

 

Fontes: O som e A Fúria de Tim Maia, de Nelson Motta & Revista Veja