Comunidades Terapêuticas NÃO SÃO manicômios

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Considero a liberdade de expressão fundamental dentro de um estado democrático de direito, mas em muitos casos ela é usada como elemento inquisitório de acusação e imputação de algo que não é a realidade do fato, sem prévio julgamento, e com decisão proferida sem recurso ou baseada nos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Além do relatório do conselho federal de psicologia de 2011 que retrata, sobre a égide de uma inspeção em 68 unidades de internação, muitas delas denominadas erroneamente de “comunidades terapêuticas”, e que baseia seu dogma ideológico em políticas públicas sobre drogas na afirmação de uma equiparação de manicômios aos das comunidades terapêuticas e contrários ao tratamento residencial. Ademais esta esguelha absurda, despropositada e disparatada,  um conhecido chargista, com um trabalho e um dom para o desenho de encher os olhos, afirmou categoricamente que as comunidades terapêuticas são campos de concentração oferecendo tratamento na base do Jesus+porrada+tranquilizante.

É sobre esse viés tendencioso comparativo que as comunidades terapêuticas têm sido rotuladas.

Os fatos e os dados se revelam de outra maneira. Primeiro, e mais importante, é que fique bem claro que o modelo das comunidades terapêuticas só aceita o internamento voluntário, evitando com isto qualquer relação com centros de internação involuntária e/ou compulsória, muito distante de uma afirmação ilógica e oblíqua assemelhada a um campo de concentração, sendo este um centro de confinamento militar para prisioneiros políticos ou de guerra.

Embora existam diversas unidades de internamento que não respeitam os direitos humanos e a dignidade humana, isto não se aplica às Comunidades Terapêuticas, assim em maiúsculo, para diferenciar aquelas que simplesmente se apossam deste termo para um registro formal de uma atividade que nem de longe se equipara a um tratamento multidisciplinar oferecido dentro do modelo de comunidades terapêuticas. Segundo os dados do Senad não ocorreu, nos últimos cinco anos, nenhuma denúncia de maus-tratos aos residentes das comunidades terapêuticas regulamentadas por este órgão no estado e, ressaltando, as CTs realizam atualmente 80% dos tratamentos dos dependentes químicos no Brasil, oferecendo uma possibilidade de reinserção social, evidenciando com isto um modelo de acolhimento com eficácia comprovada em ambientes de tratamento saudáveis, conforme dispõem os princípios 4º, 5º e 8º do NIDA (National Institute Drug Abuse) para o tratamento efetivo da dependência química, e o marco regulatório das CTs publicado em 2015 e a RDC 29/2011.

No que diz respeito à espiritualidade/religiosidade, asseguradas em nossa carta magna pelo artigo 5°, inciso VI, ela é também reconhecida, através de estudos e pesquisas, como um fator que contribui para o tratamento e a recuperação de muitos dependentes químicos. Em artigo publicado pela revista Debates Em Psiquiatria de nov/dez de 2012, e com base na pesquisa de Dalgalarrondo, há a afirmação que a associação entre a religiosidade/espiritualidade “é a mais consistente de todos os fenômenos estudados no campo saúde mental-religião”. Em estudo identificado por Koenig,  concluiu-se que o envolvimento religioso está associado a um menor uso/abuso de álcool em 86% dos casos. No Brasil, em um estudo com amostra de 3.007 pessoas representativas da população brasileira, indivíduos que não frequentavam atividades religiosas tinham taxas de uso de álcool ao longo da vida, de intoxicação no último ano e de abuso/dependência que eram o dobro dos que frequentavam semanalmente.  Ou seja, há evidências robustas de que pessoas com maiores níveis de R/E apresentam maior bem estar e menores níveis de depressão e abuso/dependência de substâncias psicoativas.

Temos que dar um basta neste tipo de procedimento intimidatório e inquisitório que permeia nossa sociedade acusando, denegrindo e imputando algo que não é verídico. Reitero a minha posição contrária aos manicômios e aos centros de tratamento, às falsas “comunidades terapêuticas”, em minúsculo, que de tratamento nada oferecem, e que o conselho federal de psicologia continue sua fiscalização junto com o ministério público, com parcimônia e critérios bem definidos, sem a generalização indevida, pois também existem psicólogos ruins e advogados péssimos.

E, principalmente, focar em oferecer todos os tipos possíveis de ambientes de tratamento saudáveis, pois uma das mais graves violações dos direitos humanos é o abuso de drogas e o seu contexto social.

 

perfil 3PITI HAUER é advogado com formação pela UFPr e habilitação específica em Ciências Penais, especializando-se em Dependência Química na UNIFESP. Membro do Conselho Estadual de Políticas Públicas sobre Drogas no Paraná (2014-2015), Colunista do Paraná Portal – “Vamos falar sobre Drogas?”, e com Curso de Extensão ao Crack: Tratamento e Políticas Públicas pela UNIAD.