Fiscalização precisa ser aprimorada para que a cultura mude

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Uma pesquisa de pós-doutorado da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), feita por Gabriel Andreuccetti com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), revela: 42,9% das vítimas de acidentes fatais de trânsito na cidade de São Paulo entre junho de 2014 e dezembro de 2015 haviam ingerido álcool. O número inclui motoristas, pedestres e passageiros.

Segundo Gabriel. apesar do consumo de álcool no trânsito ser proibido em todo o país, ainda é preciso melhorar os mecanismos de fiscalização para mudar a cultura brasileira sobre o assunto.

“Se você apenas credita à lei ao que a lei diz, é muito difícil que isso mude a cultura da população. O que a gente sabe, que é um dos fatores primordiais, é a fiscalização. Você tem a lei, que ajuda a ação policial e judicial para colocar em prática aquilo. Mas se a sensação da pessoa ao dirigir é de que ela não será pega, não adianta nada. Sua legislação pode ser a melhor do mundo mas você não vai conseguir pôr aquilo em prática. A fiscalização é o principal fator que precisa ser aprimorado para que a lei seja implementada e a cultura mude”, disse ele à Agência Brasil.

O pesquisador informa ainda que não foi possível comparar os dados para dizer se o número cresceu ou diminuiu em relação a outros períodos, pois é a primeira vez que esta metodologia está sendo aplicada no Brasil. Feita em parceria com a Escola de Saúde Pública da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, a pesquisa coletou amostras de sangue de 365 vítimas que foram levadas a unidades do Instituto Médico Legal (IML) na capital paulista para avaliação da taxa de alcoolemia em pessoas que morreram em decorrência de mortes violentas ou por causas externas, seja por acidentes de trânsito, homicídio ou suicídio e demais causas, como envenenamento, afogamento e quedas.

O resultado indicou que, em cerca de 30% das mortes violentas ocorridas nesse período foi notado consumo de álcool pelas vítimas, sendo 34,6% entre as vítimas de homicídio e 13,6% entre os casos de suicídio.

“No caso de acidentes de trânsito, podemos, com certeza, dizer que é um número alto porque se tem quase metade das vítimas que chegam atropeladas ou de acidentes de trânsito com nível de álcool”, disse Gabriel.

A maior parte das vítimas de mortes violentas no trânsito associadas ao consumo de álcool, de acordo com o pesquisador, são homens brancos, com mais de 30 anos e baixo nível de escolaridade. Ainda de acordo com Gabriel, a taxa de alcoolemia observada entre as vítimas de morte violenta foi, em média, 1,10 grama de álcool por litro de sangue, o que corresponde ao consumo de cinco doses-padrão de álcool para um homem de cerca de 70 quilos. Cada dose-padrão, explicou o pesquisador, corresponde a uma latinha de cerveja, uma dose de destilado ou uma taça de vinho. Entre as vítimas de acidentes de trânsito, a maior parte apresentou alcoolemia nos finais de semana e no período noturno.

Para o pesquisador, os resultados podem ajudar a orientar políticas de saúde pública e até ações de fiscalização do trânsito. “A maior contribuição deste estudo não é a prevalência em si, mas sim a cultura do como fazer e de como medir de forma correta, para que um dia a gente possa dizer que tal política está funcionando ou não”, disse ele que pretende, ainda, estender a pesquisa para a análise de uso de drogas e outras substâncias pelas vítimas.

Enquanto isso, o Senado aprovou um projeto que endurece a punição ao motorista que cometer homicídio culposo e estiver dirigindo sob efeito de álcool ou outras substâncias psicoativas. Como o texto, que tem origem na Câmara, foi alterado pelos senadores, terá que voltar para nova análise dos deputados.

De acordo com o relatório do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), aproximadamente 40 mil brasileiros morrem por ano no trânsito. Como atualmente a pena é de dois a quatro anos de reclusão, a proposta aumenta a punição para quatro a oito anos. Além disso, o projeto cria também o crime de lesão corporal grave culposa nos casos em que o condutor do veículo está sob efeito de álcool e outras substâncias psicoativas. Neste caso, o motorista que provocar o acidente será punido com dois a cinco anos de reclusão.

Ao defender a aprovação da proposta, Aloysio alerta que as principais causas da violência no trânsito estão “relacionadas à condução do veículo sob o efeito de álcool ou de entorpecentes e à imprudência de trafegar em velocidade acima da permitida, sendo que a impunidade contribui para que a prática de tais condutas não seja desestimulada, aumentando, a cada ano, a mortalidade no trânsito”.

 

Fontes: Agência Brasil & G1