Heil, Hitler – o dependente

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Adolf Hitler era usuário de Pervitin, uma droga à base de metanfetamina. É o que afirma a neurologista Virna Teixeira, especializada em dependência química pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) para quem o médico particular do Führer, Theodor Morell, costumava aplicar-lhe uma mistura injetável de glicose e Pervitin sempre ele precisava de um “estímulo” – como nos dias em que fazia longos discursos. “Nos 2 ou 3 últimos anos de vida, Hitler passou a usar metanfetaminas diariamente”, afirma Virna. “Pode-se dizer, portanto, que ele era um dependente.”

Mas Hitler não estava sozinho nessa. Os nazistas também bombavam seus combatentes com metanfetaminas – drogas químicas extremamente fortes que estimulam o sistema nervoso central. Calcula-se que, entre 1939 e 1945, cerca de 200 milhões de pílulas de Pervitin tenham sido distribuídas entre as tropas alemãs que lutavam na 2ª Guerra. Além de deixar os soldados mais ligados, sem sono, sem fome e sem sede, o poder de concentração aumentava, assim como a capacidade de resistir à dor – fora a autoconfiança nas alturas.

É claro que os combatentes aliados também consumiam estimulantes, mas em quantidade bem menor. Foi fazendo uso indiscriminado desse tipo de substância que as Forças Armadas alemãs invadiram de maneira avassaladora a Polônia, a Holanda, a Bélgica e a França na fase inicial do conflito.

O Pervitin não foi originalmente desenvolvido para fins militares. Sintetizada em 1938 por um laboratório farmacêutico chamado Temmler, a droga rapidamente se transformou num sucesso de vendas entre a população civil da Alemanha. Não demorou, contudo, para que seus efeitos estimulantes chamassem a atenção de gente ligada à máquina de guerra nazista. Em agosto de 1939, o médico Otto Ranke, da Academia de Medicina Militar de Berlim, decidiu testar a substância em 90 estudantes universitários e ficou convencido de que ela poderia ajudar os alemães a vencer a guerra. Os primeiros a consumi-la numa frente de batalha foram motoristas que participaram da invasão da Polônia. Logo depois, as pílulas passaram a ser distribuídas sem qualquer restrição entre as tropas alemãs em todos os fronts.

Apesar do Alto-Comando recomendar que a droga fosse consumida com alguma moderação (um ou dois comprimidos), no calor dos combates cada vez mais longos e intensos ninguém seguia essa orientação. Em janeiro de 1942, por exemplo, um grupo de 500 soldados nazistas estava a ponto de se render aos soviéticos no front oriental. Estava no auge do inverno, a temperatura batia na casa dos 30 graus negativos e os combatentes alemães largavam suas armas sucumbindo à exaustão. Foi quando o comandante ordenou ao médico da tropa que distribuísse Pervitin à vontade. “Meia hora depois”, segundo descreveu um oficial alemão em seu diário, “os homens já se sentiam bem melhores. Começaram a marchar novamente, recobraram o vigor e escaparam do cerco”.

Virna Teixeira acredita que vários problemas de saúde enfrentados pelo ditador alemão eram decorrentes do uso regular de Pervitin. Hitler teve duas hepatites e sofria de hipertensão – enfermidades que, de acordo com a neurologista, podem ser provocadas por metanfetaminas. “Hoje, sabemos que, entre os efeitos colaterais dessas substâncias, destacam-se taquicardia, elevação da pressão arterial, arritmias, hepatites tóxicas e acidentes cardiovasculares, entre outros.” Usuários contínuos de metanfetaminas, segundo Teixeira, também correm mais risco de desenvolver o mal de Parkinson. “E Hitler apresentava claros sinais dessa doença na fase final de sua vida”.

Os soldados também não escaparam: alguns chegaram a morrer em decorrência do consumo excessivo – vítimas de paradas cardiorrespiratórias ou ataques fulminantes do coração. Nada disso, porém, foi suficiente para que a droga fosse banida ou, pelo menos, tivesse seu consumo controlado. E o pior: um estudo recente publicado pela Associação de Médicos da Alemanha revelou que, além de distribuir Pervitin entre seus soldados, o regime nazista produziu outro tipo de estimulante químico para uso em combate – a DI-X.

Desenvolvida em março de 1944 pelo farmacologista Gerhard Orzechowski, a pedido de Hellmuth Heye, vice-almirante da Marinha alemã, a droga levava cocaína, metanfetamina e Eukodal, um analgésico derivado da morfina, em sua composição e teve sua eficiência testada em prisioneiros do campo de concentração Sachsenhausen, ao norte de Berlim.

O plano era distribuí-la em quantidades ainda maiores do que fora feito com o Pervitin, sobretudo entre os soldados das linhas de frente. Mas não houve tempo para isso. Com a invasão da Normandia por tropas americanas em junho daquele mesmo ano e o avanço soviético no front oriental, as forças de 3º Reich rapidamente entraram em colapso. Menos de um ano depois, Hitler se suicidaria, e a Alemanha se renderia incondicionalmente às forças aliadas.

 

Fonte: Superinteressante