Os problemas dos pais de filhos adictos

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Uma das maiores causas da destruição de lares, famílias e vidas, em diferentes épocas, tem sido o vício, em todas as suas formas. Há inúmeros tipos de vícios, tantos que seria impossível catalogar, até porque a cada momento surgem novos tipos, à medida que novos costumes, novas tecnologias e novos conhecimentos vão surgindo. Na verdade, tudo pode se transformar num vício, do simples hábito de roer unhas ao vício compulsivo de gastar dinheiro, passando, como já vimos aqui, pelos chamados vícios emocionais.

O vício é, portanto, uma forma de escravidão, representa a perda do arbítrio, a perda do controle que temos sobre nós mesmos e nossos hábitos. E quase todos nós temos algum tipo de vício. Entender isto é de suma importância para quem tem ou lida com pessoas que têm algum tipo de vício, em especial o vício em drogas.

Em 1993, o Dr. Alberto Corazza, então Delegado de Polícia de São Paulo chefiando a divisão de prevenção e educação do Departamento Estadual de Investigação sobre Narcóticos (Denarc), causou polêmica ao afirmar que a maioria dos viciados tem problemas em casa e propondo tratar toda a família e não apenas o viciado. Ele foi entrevistado pelos principais veículos de comunicação do país, e as revelações que ele fazia eram tão bombásticas naquela época quanto o são hoje, revelando que de lá para cá a situação só piorou. Dr. Alberto afirmava ter pena de alguns jovens viciados por terem de viver com pais tão desequilibrados, que mereciam estar internados para que seus filhos pudessem viver em paz. Em uma entrevista à Revista Veja, ele contou que os pais levavam seus filhos para pedir ajuda como quem leva um eletrodoméstico para o conserto: “Os pais falam assim: ‘Esse é nosso filho. Já não o aguentamos mais. Cuidem dele para nós’, e vão indo embora. Então, eu respondo rápido: ‘Um momento, vocês não vão querer um recibo do rádio que trouxeram para consertar?”.

“É muito difícil para a família aceitar um filho drogado, mas às vezes o defeito não está no rádio, mas na tomada em que o rádio está ligado”, dizia o dr. Corazza. O Delegado afirmava que muitos viciados tiveram o primeiro aprendizado em casa e que, de alguma forma, 80% dos drogados tinham problemas familiares graves. Em qualquer casa há remédios para resolver quase todo tipo de problema, e é lógico que a cultura da automedicação influencia os jovens. Outro fator significativo na tendência de jovens ao vício é o fenômeno crescente do alcoolismo entre os pais. O alcoolismo é uma das maiores causas de morte não natural no Brasil. Então, “como é que um pai que bebe desregradamente pode pedir ao filho que não use maconha, se ambos estão no mesmo processo de fuga e só a droga é diferente?”, concluía Dr. Alberto.

A cada pai que o procurava, o delegado respondia em três etapas. Primeiro, dizia ao pai que seu filho não se tornara um monstro só porque estava usando drogas, nem era um anjo antes, quando não se sabia que ele era viciado — ele continua o mesmo filho. Depois, deixava claro que isso não era o fim do mundo, desde que se soubesse administrar o problema. Por fim, explicava que o jovem teria de ter apoio profissional porque, sozinho, nem o jovem nem o pai conseguiriam administrar o problema. Quando questionado sobre a possibilidade de alguém libertar-se sozinho do vício, ele era enfático: “Ninguém pode dizer que cheirou cocaína por dois, três anos, parou numa boa e nunca mais usou. No máximo 10% das pessoas viciadas conseguem fazer isso. O mais comum é encontrar pessoas que começaram a usar drogas numa boa, imaginando serem consumidores sociais, e depois se arrebentaram”.

A droga é a mais democrática das enfermidades sociais: pega o pobre, a classe média e o rico. O que muda, de acordo com a camada social, é apenas o tipo de droga consumida.

 

Fonte: Crônicas do Lordello, via Jorge Lordello, especialista em segurança pública e pesquisador criminal