Drogas e Rock’n roll: um barato que sai caro

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O uso de drogas sempre esteve presente em rituais e comemorações de diversas sociedades. No entanto, para o imaginário social contemporâneo, o uso ou abuso dessas substâncias é caracterizado de forma contraditória e até antagônica.

De um lado a droga é vista como algo mortal, que denigre todos os valores morais da família e do Estado. Por outro, é revestida por uma aura de transgressividade frente aos antigos valores tradicionais e ligada a conceitos como ‘liberdade’, ‘autoconhecimento’ e ‘expansão de consciência’. Mas qual das duas está correta, e como uma coisa que escraviza pode estar associada à liberdade?

O uso de drogas sempre esteve associado a festas e à criação dos poetas e músicos boêmios. Na década de 50, por exemplo, um grupo de escritores conhecidos na época como a geração ‘Beat’, ou ‘beatniks’, pregavam o uso de substâncias psicoativas como ideal de liberdade e de contestação. Fortemente inspirado por eles, John Lennon deu o nome aos “Beatles”, baseado na palavra “beat”. Esse movimento era encabeçado por um escritor chamado Jack Kerouac, que escreveu o livro On the Road, uma espécie de ‘bíblia’ do movimento hippie e que, mais tarde, o próprio Kerouac se arrependeu de haver escrito por incentivar os jovens de sair pelos Estados Unidos usando drogas e pedindo carona.

Pouco tempo depois, Jim Morrison batizou sua banda The Doors em homenagem ao livro As Portas da Percepção, de 1954, escrito por Aldous Huxley. Ao experimentar a mescalina, um alucinógeno alcalóide extraído do cacto peiote (Lophophora williamsii), Huxley teve uma experiência que o lembrou das palavras de William Blake (1757­1827): “Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito”.

É nessa época também que a palavra ‘psicodélico’, uma composição das palavras gregas psiké (alma) e delos (manifestação), começou a ser usada. Ela denomina experiências que produzem efeitos profundos sobre a experiência consciente e pela percepção de aspectos da mente anteriormente desconhecidos.

Devido à droga ter se tornado um “estilo de vida” (ou “estilo de morte”, como preferir), inúmeras pessoas pagaram um alto preço pelo abuso de substâncias psicotrópicas.

Para citar os artistas mais conhecidos que morreram, ou de overdose, ou em decorrência do uso excessivo, estão Janis Joplin, morta aos 27 anos, em 1970 por overdose de heroína; Elvis Presley, consumidor abusivo de drogas medicamentosas, que morreu em 1977 de falência cardíaca, aos 42 anos; Jimi Hendrix, que morreu em 1970, sufocado em seu próprio vômito por causa de uma overdose de barbitúricos; e. Kurt Cobain, do Nirvana, que cometeu suicídio em 1994, após consumir uma enorme quantidade de heroína.

No Brasil, inúmeros artistas também tiveram sérios problemas, como Raul Seixas, que morreu em 1989 com a saúde comprometida pelo excesso de álcool e drogas. Ou Cássia Eller, que morreu em 2001, por problemas cardíacos decorrentes do uso de álcool e de cocaína. O caso do cantor Renato Russo, do Legião Urbana, também chama a atenção. Ele morreu em consequência de complicações causadas pela Aids, em 1996. Mas ele admitiu ter parado de usar drogas alguns anos antes, em 1994, quando fez tratamento e entrou para o grupo dos Alcoólicos Anônimos.

E foi durante o tempo que esteve internado em uma clínica que ele escreveu a música Só por Hoje. Nela, ele conta sua transformação no modo de pensar, aprendendo a viver “um dia de cada vez” e enfrentando seus problemas com calma e serenidade. Mas existem casos em que é possível perceber a clara degradação moral que a pessoa está enfrentando e, mesmo assim, não consegue aceitar o tratamento. Um dos mais notórios mundialmente é a da cantora Amy Winehouse. Muito talentosa, mas extremamente autodestrutiva, em uma de suas letras, Rehab, ela expõe que o tratamento não serve para nada, pois ela pode aprender tudo “com o dono do bar”.

São escolhas pessoais, mas que cada uma leva a um resultado diferente. Muitas pessoas não vão morrer pelo uso de drogas. Mas seu uso pode trazer inúmeros prejuízos e consequências só percebidas depois de muitos anos. É necessário, porém, que as pessoas desenvolvam uma consciência crítica para perceber que usá-­las não é só uma diversão.

Usá-­las também é uma escolha que demonstra muitas vezes uma falta de habilidade emocional muito grande e que a pessoa, querendo ou não, admitindo ou não, pode sofrer consequências gravíssimas.

 

FREDERICO ECKSCHMIDT é psicólogo, especialista em dependência química e mestrando pela Faculdade de Medicina da USP. Possui pós-graduação em Social Health, pela Harvard University e é também é sócio-diretor do Núcleo Synthesis. Email: frederico@nucleosim.com.br

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