Drogas: a 3ª Via

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A falência da aplicação somente do viés da Saúde ou do sistema punitivo-repressivo em relação ao fenômeno das drogas é alarmantemente perceptível à todos os envolvidos com o álcool e outras drogas e com a Dependência Química, somente nésciopatas obtusos é que defendem tanto uma como outra afirmando que são os únicos caminhos que detém uma solução, que pela própria irredutibilidade ideológica, torna-se inalcançável e inviável em relação à prevenção, cuidado, tratamento, recuperação e reinserção social.

A incapacidade do Estado de aplicar eficazmente a Política Pública sobre Álcool e outras Drogas direcionando toda a sua conjuntura de cuidado e tratamento somente aos CAPs implodiu. A ideia inicial de um modelo asilar assistencial diferenciado para com a Saúde Mental, garantindo os direitos de seus usuários, com a participação social, é singular e radiante, mas a logística do sistema e a dinâmica da rede de drogas emperrou este ambiente de tratamento na sua quase totalidade, com raríssimas exceções. Dos quase 175 CAPs AD previstos para entrar em funcionamento até final de 2014 somente 59 foram inaugurados, e destes metade em precárias condições, além do fechamento no SUS de quase 7 mil leitos nos últimos cinco anos relacionados a questão das drogas associadas a outros transtornos mentais.¹

No lado diametralmente oposto vislumbramos o viés repressivo-punitivo, que mais estigmatiza e segrega o usuário, ao invés de tratá-lo e reinseri-lo na sociedade com um gasto de quase 5 bilhões/ano para manter prisões e unidades de cumprimento sócio-educativas. 64,7% das mulheres encarceradas cumprem pena por porte de drogas ilícitas e o número de detentos triplicou nos últimos 10 anos com a promulgação da Lei 11.343/06 que não estabelece critérios quantitativos para diferenciar usuário, traficante e o tráfico para uso próprio. Entre os adolescentes o roubo associado ao tráfico para uso é responsável por 63% das penas privativas de liberdade, sendo cada vez mais eventuais as alternativas terapêuticas e de educação e informação conduzindo a uma reinserção social.²

Diante deste quadro perturbador, inoportuno e sombrio, onde a realidade contrasta com a teoria de uma Política Pública sobre Álcool e outras Drogas que foi elaborada por engravatados de gabinetes, nada mais real do que uma 3ª VIA para divergir este quadro. A 3ªVia é uma alternativa de Políticas Públicas sobre Álcool e  outras Drogas baseada em pesquisas com evidências científicas para a elaboração e aplicação destas mesmas Políticas, onde o dinheiro público deve ser aplicado principalmente em prevenção e tratamento, sabedores que de cada dólar aplicado em prevenção economiza-se sete outros em tratamento e de que cada dólar aplicado em tratamento poupa-se outros dez ao sistema penitenciário, onde a Justiça Terapêutica deve ser amplamente difundida ao máximo nos municípios brasileiros, onde as Comunidades Terapêuticas (aquelas com tratamento voluntário e multidisciplinar e adequadas a RDC29/2011 e ao Marco Regulatório de 2015) sejam reconhecidas pelo acolhimento de quase 80% dos dependentes químicos, onde  grupos em situação de vulnerabilidade e mais expostos ao uso de drogas tenham um acolhimento com dignidade, onde os programas de redução de danos sejam aplicados observando realmente seu compromisso com a saúde pública e não como uma doutrina ideológica reacionária, tosca e míope, onde a espiritualidade prevaleça sobre crenças fanáticas e onde os familiares de dependentes químicos e os grupos de mútuo-ajuda tenham ampla participação na recuperação do adicto/dependente químico.

 

1- Conselho Federal de Medicina.

2- Anuário Brasileiro de Segurança Pública e Departamento Penitenciário Nacional.

 

PITI HAUER é advogado com formação pela UFPR e habilitação específica em Ciências Penais, especializando-se em Dependência Química na UNIFESP, 1º Vice-Presidente da FEPACT – Federação Paranaense das Comunidades Terapêuticas, Membro do Conselho Estadual de Políticas Públicas sobre Drogas no Paraná (2014-2015), Colunista do Paraná Portal – “Vamos falar sobre Drogas?”, colaborador do site “Para Entender a Dependência Química” e com Curso de Extensão ao Crack: Tratamento e Políticas Públicas pela UNIAD.