E o palhaço, o que é? Uma alegria contra as drogas

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Um palhaço que discute o vício em drogas e a humanização nas equipes hospitalares. Assim é Rogério Rodrigues, de 42 anos. Ou melhor: Titão. Morador de Padre Miguel (RJ), ele colocou o nariz vermelho em 2002, quando teve o primeiro contato com a arte num evento na igreja.

Mas não queria levar apenas o riso para o público e resolveu criar o “Alegria contra as drogas”. Neste projeto, Rogério vai para uma praça acompanhado de seu amigo Leandro Maduro, o palhaço Batata. Durante o espetáculo, Titão se encanta por uma pedra colorida (o crack) e resolve pegar, mesmo com uma placa avisando para não tocar. A partir daí, o palhaço vai enfraquecendo e chega a ficar paralisado. Até que surge o Batata e consegue tirar a pedra para guardá-la numa caixa.

A ideia nasceu em 2009, depois de Rogério fazer um trabalho numa clínica de recuperação.

— Se tivesse a prevenção, não seria necessário recuperar — explica.

O espetáculo já foi apresentado em praças de Bangu, Realengo e Padre Miguel, próximas às áreas de vendas de drogas.

Apesar de nariz de palhaço, sapato de palhaço e maquiagem de palhaço, Titão não faz apenas graça: ele é um palhaço cristão.

— A diferença é que temos compromisso com os valores e com a verdade. O riso, para nós, é um caminho não só para aplausos, mas uma reprodução das palavras de Deus — diz.

A experiência fez com que Rogério escrevesse o livro “Meraki: a construção do trabalho cristão” e fosse chamado para lecionar sobre a importância do palhaço cristão no cenário nacional no 2º Congresso de Palhaços Cristãos.

Ele explica que, mesmo sendo um palhaço cristão, pode empregar todas as velhas brincadeiras, como aquela de espirrar água no rosto de alguém:

— A malícia que é o problema. Lutamos contra a sensualidade que foi colocada nos palcos. A comédia não precisa disso.

O nome Titão não veio fácil. Durante muito tempo, Rogério trabalhou com o nome Feijão, o Palhaço Cristão. Até que, um dia, uma criança que não sabia falar o nome completo pronunciou a palavra Titão:

— A identidade do palhaço é construída ao longo do tempo.

Antes de começar a fazer palhaçadas por aí, Rogério trabalhou como barbeiro e educador social numa clínica de recuperação. Lá, organizava oficinas empregando brincadeiras antigas com os jovens. O trabalho era usado como degrau para que a equipe de psiquiatria conseguisse chegar aos adolescentes.

— Passei por muita coisa na infância, mas nunca me envolvi com nada porque eu brincava. De alguma forma, isso influenciou na minha vida. Então comecei a estudar as brincadeiras e colocar regras — conta Rogério, que já perdeu amigos para o tráfico.

As dificuldades não existiam só quando era criança. Apesar do sorriso do palhaço, ele passa por uma crise financeira. O contrato de um ano do trabalho de humanização no Hospital Camim, em Realengo, acabou. Além disso, o projeto “Alegria contra as drogas” não tem apoio e o livro também precisa de patrocínio para ser publicado.

— Não queria desistir da arte da palhaçaria — diz ele, que também anima festas.

O projeto de humanização no Hospital Camim surgiu inspirado pelo filme “Patch Adams: o amor é contagioso”. Ao contrário de alguns grupos de palhaços que trabalham visitando pacientes em hospitais, Rogério atua mais com a equipe médica e os funcionários do hospital, como os da limpeza, cozinheiros e atendentes.

— Sabemos que a visitação ameniza o problema dos pacientes, mas depois que o palhaço vai embora tudo volta ao normal e quem fica é a equipe técnica — explica o palhaço, ressaltando que também brincava com quem aguardava a consulta.

Titão conta que se surpreendeu com o trabalho, pois descobriu que, muitas vezes, quem estava “doente” era a equipe.

— O palhaço pode ser uma grande ferramenta para transformar o dia desse médico, que é o único que pode transformar o dia desses pacientes.

 

Fonte: Jornal Extra