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Nada está tão ruim que não possa piorar. Esta parece ser a premissa básica da Política Pública sobre Drogas no Brasil debatendo e discutindo, sob o viés da saúde e do proibicionismo, a questão da descriminalização de TODAS as drogas, enquanto que o foco deveria estar voltado para a Prevenção e Tratamento, com investimentos vultosos em ambos os eixos desta mesma Política.
A imbecilização do debate conduzida por um grupo de doidivanas, mascarado sob a alcunha de pseudo-pesquisadores, tem como carro chefe a ineficiência de nosso sistema carcerário e o direito individual das pessoas terem a posse de drogas para uso pessoal. O que se discute no STF é a inconstitucionalidade do art.28, ou seja, se o legislador pode ou não interferir nos direitos fundamentais assegurados pela nossa Carta Magna. Consequentemente a isto, “esses lentíssimos” Ministros estão examinando este caso longe daquilo que é proposto no recurso em questão, elucubrando-se numa área que não dominam e nem tem a obrigação de dominar, ou seja, o uso e/ou abuso de substâncias psicoativas, que são muito mais pertinentes ao campo da medicina e neurociência.
Quanto à relação de nosso sistema penitenciário, já não é de hoje que pouco ou quase nada se investiu para uma melhoria de qualidade, visando o caráter de reintegração e ressocialização daqueles que lá se encontram. Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Universidade Federal de Brasília, de 2009, apontou que 80% dos presos por tráfico são microtraficantes, em sua maioria jovens entre 16 e 27 anos, pobres, e que vendem drogas para o sustento de seu vício. O primordial, aquilo que é o mais importante, neste momento, para depois, num segundo instante, debatermos com a sociedade a descriminalização, regulamentação ou liberação desta ou daquela droga, é a definição em critérios quantitativos daquilo que é para uso e para o tráfico, visto que o nosso sistema repressivo/proibicionista está muito aquém com a preocupação relacionada entre a cultura da pobreza, as drogas e o viés social.
Outra questão preponderante nesta polêmica é a imersão de resenhas comparativas com outros Países, principalmente Uruguai e Portugal. Com populações de 3,5 e 10,5 milhões de habitantes respectivamente, estes países estão muito abaixo dos nossos 204 milhões, além do que a área geográfica é absurdamente inferior aos nossos 8,5 milhões de km² (Uruguai – 176 mil km² e Portugal 92 mil km²). Ou seja, se somarmos estes dois países eles ainda possuirão uma área menor que o estado do Rio Grande do Sul, portanto mais fácil de aplicar, viabilizar e implantar Políticas Públicas de Saúde e Sociais com o foco no fenômeno das drogas. Ademais o fundamento principal para uma nova abordagem de Saúde aos usuários de drogas em Portugal, considerando-os como doentes, assim como definido pela OMS, é que no final de 1999 Portugal tinha a maior taxa de HIV dentre os países da União Europeia, estimando quase 100 mil usuários de heroína e que, a partir de julho de 2001, com a nova Lei descriminalizando a posse de drogas – e aqui o ponto mais importante –, esta Lei VEIO ACOMPANHADA DE INVESTIMENTOS DE MAIS DO QUE O DOBRO EM TRATAMENTO E PREVENÇÃO ÀS DROGAS.
A NOSSA REALIDADE É OUTRA. É uma realidade de famílias sendo destroçadas pela ação contínua de uso e abuso de drogas; é uma realidade da insegurança da sociedade onde mais de 80% dos crimes advém do tráfico de drogas; é uma realidade de estigmatização de usuários e dependentes químicos como se estes nada mais pudessem produzir ou criar em uma sociedade; é uma realidade hipócrita que flui entre reduzir os custos de saúde ou aniquilar aqueles que “perturbam” e que mais necessitam de um acolhimento deste serviço; é uma realidade em que os interesses financeiros sobrepõe a real necessidade de ajuda daqueles que estão sofrendo com as drogas; é uma realidade que enquanto não municipalizarmos EFETIVAMENTE a Política Pública sobre Drogas esta nada mais será do que um arcabouço deletério sem praticidade alguma; é uma realidade na qual o Estado conta com uma caricata rede de assistência e saúde precisando urgentemente aumentar, assegurar e capacitar esta rede para promoções, em relação à população (público em geral) de ações em prevenção e tratamento. Enfim, sem pretenciosismos, a realidade é apoiarmos iniciativas que vão ao encontro dos desamparados da dependência química e que continuam sobrevivendo na exultação ilusória de uma escolha perigosa.
A pesquisa supramencionada analisou 730 sentenças judiciais de primeira instância, 128 acórdãos de tribunais no Rio de Janeiro e no Distrito Federal, 103 acórdãos do STJ e decisões do STF que tinham por objeto crimes de drogas e identificou que, em 89% dos casos, o réu foi preso em flagrante; em 62%, o condenado por tráfico de drogas respondeu sozinho ao processo. Quando houve concurso de agentes, em 87% dos casos não houve quadrilha ou bando – ou seja, a atuação se deu entre duas ou três pessoas. Em 55% dos casos os réus eram primários, e em 46% dos casos foi aplicada a causa de diminuição de pena prevista no § 4o do art. 33 (agente primário, de bons antecedentes, que não se dedica à atividade criminosa nem integra organização criminosa).
PITI HAUER é advogado com formação pela UFPr e habilitação específica em Ciências Penais, especializando-se em Dependência Química na UNIFESP. Membro do Conselho Estadual de Políticas Públicas sobre Drogas no Paraná (2014-2015), Colunista do Paraná Portal – “Vamos falar sobre Drogas?”, e com Curso de Extensão ao Crack: Tratamento e Políticas Públicas pela UNIAD.