O assassino de crianças

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O apelido já explica muito: “assassino de crianças”. Também conhecido como “droga dos pobres”, o paco já provocou estragos imensuráveis na Argentina, seu país de origem, onde destruiu milhares de vidas e causou uma onda de violência induzida pelo seu ciclo como nunca foi vista antes nas ruas deste país.

A epidemia do paco tem sido facilitada por fronteiras muito abertas, dificuldades econômicas e a diminuição de restrições quanto à cocaína desde que Evo Morales assumiu em 2006, na vizinha Bolívia. O resultado tem sido a democratização da cocaína nesta região da América do Sul, que se converteu no local para desejo de uma cocaína mais barata e de qualidade inferior. Nos cinco anos em que os residentes locais começaram a reparar nos grosseiros cristais amarelados sendo fumados nas ruas de Ciudad Oculta, um bairro com 15 mil pessoas dentro de Buenos Aires, o paco se tornou a principal droga vendida pelos traficantes dali.

Ou seja, o paco nada mais é do que uma nova denominação para a cocaína que, assim como o crack, deve ser fumado em vez de injetado ou inalado. O problema é que, quando fumado, apresenta uma taxa de absorção muito rápida, que é o seu diferencial. A intensidade do prazer provocado pela droga é diretamente proporcional, portanto, à rapidez da dependência causada – algo muito semelhante com o crack usado aqui no Brasil. Entretanto, o paco é bem mais tóxico que o crack porque contém uma grande quantidade de solventes e até querosene para pouca cocaína. O resultado dessa mistura é uma droga com efeito menos duradouro, que, segundo especialistas, induz o usuário a consumi-la em maior quantidade. Carlos Damin, professor de toxicologia da Universidade de Buenos Aires, explica que o paco pode ser considerado um “crack de pior qualidade”.

Na Argentina, a disseminação do paco se deve, também, ao baixo preço. Por apenas 2 pesos (pouco mais de R$ 1) é possível comprar uma pedra de paco no país.

A situação já é tão preocupante que o escritório da ONU contra Drogas e Crimes (UNODC) no Brasil e Cone Sul divulgou, no início do mês, relatório da Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes (Jife) que alertando sobre o paco. O documento revela um cenário grave com crianças de 8 e 9 anos consumindo a droga na Argentina e alerta para o crescimento exorbitante do consumo de crack no Brasil.

Nosso país, aliás, em poucos anos também se tornou um consumidor considerável de cocaína, agora ocupando a posição de segundo maior consumidor total desta droga no mundo, depois dos EUA, segundo o Departamento de Estado daquele país. É por isso que a rápida disseminação do paco marca uma mudança significativa tanto para Argentina quanto para o Brasil.

A onda de cocaína de má qualidade atingindo as ruas resultou numa investida de ambos os governos contra as substancias químicas necessárias para a transformação da pasta de cocaína, ou pasta base, como é chamada, em pó. Leis alfandegárias mais rígidas para deter o fluxo das substâncias químicas, manufaturadas em grandes quantidades em ambos os países, limitaram o acesso dos traficantes bolivianos buscando refinar a base da cocaína para transformá-la em pó de maior valor, segundo declarou o Gen. Roberto Uchoa, secretário nacional de drogas no Brasil. Assim, enquanto a qualidade do produto boliviano caiu, o mercado europeu em particular tem rejeitado a droga de menos qualidade e, desta forma, mais dela veio para o Brasil e foi para a Argentina.

Segundo a polícia, a cocaína que se compra na rua é menos de 30% pura porque os traficantes estão diluindo a cocaína em pó com substâncias que vão de ácido bórico a lidocaína até fermento, o que leva a diversos problemas de saúde em seus usuários, como infecções e coágulos no sangue, segundo autoridades da área de saúde que consideram estas misturas como “o lixo da cocaína”.

E, como todo lixo em forma de droga, o paco pode provocar sérios danos à saúde, causando complicações cardiovasculares, pulmonares e cerebrais. Como no caso do crack, quando a dependência se instala torna-se muito difícil livrar-se dela. Sua privação, por outro lado, provoca intensos quadros de síndrome de abstinência.

 

Fonte: Jornal da USP