Afinal, o que é… DEPENDÊNCIA?

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Quando falamos em dependência, uma das primeiras coisas que vem à nossa mente são as dependências relacionadas ao álcool e uso de drogas e entorpecentes. Poucos colocariam em sua lista, num primeiro momento, a compulsão por comida, o vício por smartphones e aparelhos eletrônicos, a compulsão por compras, desejos desenfreados por sexo (ninfomania), o cigarro, remédios, jogos e mais uma série de outras situações.

Por isso, é preciso abrir o campo de visão quando se toca nesse assunto, pois podem haver muitas outras experiências que causam dependência, sejam elas químicas (álcool, entorpecentes, fumo, medicamentos, etc) ou não-químicas/comportamentais (compulsão por compras, aparelhos eletrônicos, jogos, sexo, etc). Evidentemente, nos casos de dependência química existe o abuso de uma determinada substância que fortalece o vício em decorrência de interações fisiológicas no organismo do indivíduo, o que não ocorre nos casos de dependências comportamentais. Entretanto para muitos autores “o mecanismo do comportamento adictivo é bastante semelhante em ambos os casos”.

Segundo uma especialista do instituto junguiano de Nova Iorque, a dependência pode estar relacionada ao mito da deusa celta Maeve. “Maeve é uma figura da mitologia cujo nome significa ‘aquela que intoxica’; a autora faz uma análise simbólica desta figura, que, ao mesmo tempo em que traz o êxtase e a dependência também é capaz de trazer a cura. Para ela, a dependência, seja ela química ou comportamental, é como um espaço transicional, onde o dependente cria um mundo ilusório, um espaço transitório entre a vida real e suas fantasias, para não ter de encarar os problemas. E o comportamento dependente ou o uso de substâncias seria uma forma de encontrar um meio de dominar o medo”.

Abaixo falarei um pouco mais sobre algumas das situações mais comuns causadoras de dependência.

A questão da dependência de uso de drogas, para alguns autores, está relacionada à falta de rituais de passagem em nossa sociedade. Assim, o jovem experimenta a droga como uma forma de entrar em contato com o transcendente, isto é, o jovem que utiliza drogas quer transcender a si mesmo a qualquer custo, mesmo que isso lhe cause danos físicos à saúde.

É “uma ingênua e inconsciente tentativa de conseguir identidade e papéis definidos, mesmo que negativamente”. Para o sujeito, esse movimento, ao contrário de ser uma fuga da sociedade, seria uma tentativa desesperadora de encontrar um lugar nela.

O uso abusivo de álcool, por sua vez, está associado ao indivíduo que busca “um mundo onde tudo pode acontecer”, no qual é possível vivenciar “outro personagem”, diferente daquele que se é quando está sóbrio, isto é, um rapaz trabalhador, uma esposa exemplar, dentre outros papéis.

Dessa forma, a bebida se torna a porta de entrada para esse outro mundo. Nesse lugar o sujeito experimenta tanto o lado jubiloso como a desgraça de se estar ali, ou seja, pode experimentar seus aspectos mais destrutivos, como, por exemplo, a violência e a loucura.

Enquanto os usuários de drogas, tipicamente adolescentes, experimentam situações regressivas, os dependentes de jogos, em geral, são pessoas mais velhas que vivenciam outras questões. São pessoas que se consideram vencedoras, mas por não conseguirem sustentar essa posição por muito tempo colocam a perder tudo que conquistaram até o momento.

Os principais motivos apontados pelos dependentes para manter seu comportamento são a solidão, o tempo ocioso, a depressão, carências e fuga de conflitos.

O fenômeno da dependência, seja ele químico ou não, é bastante complexo e passível de diversas interpretações de acordo com a psicologia analítica junguiana. Porém, algo se assemelha diante dos pensamentos de diversos autores que falam sobre o assunto. Todos relatam de alguma forma que a dependência é uma maneira que o sujeito encontra para distanciar-se da realidade, ou seja, fugir de um sofrimento psíquico. No entanto, essa fuga se torna uma situação de sofrimento igual ou ainda maior, se tornando um ciclo vicioso.

Por isso, é recomendado que a pessoa que sofre com algum tipo de dependência busque a psicoterapia, pois nela pode-se trabalhar questões mais profundas que não apenas o comportamento dependente, questões estas que só virão à tona em um processo de análise. A psicoterapia pode dar forças ao sujeito para enfrentar essas situações ao invés de fugir delas.

 

Rafael Guerra – Psicólogo – CRP 06/128867