Drogas e meio ambiente – uma combinação desastrosa

Tempo de leitura: 3 minutos

Um artigo científico publicado no The Guardian revelou que a cocaína, na concentração que é encontrada nos rios europeus, causa inchaço e disfunções nos músculos e torna as enguias da espécie Anguilla Anguilla (foto) animais hiperativos – o que poderia impedi-los de completar as migrações que fazem para se reproduzir.

Para se ter uma ideia do nível desta concentração, no trecho do rio Tâmisa que corta Londres, a concentração de benzoilecgonina (um resquício metabólico que sai na urina de quem consome cocaína) é de 17 bilionésimos de grama por litro de água. Uma análise feita no rio italiano Pó em 2005 revelou que ele dá vazão a 4 kg de cocaína diariamente.

Anna Capaldo, pesquisadora da Universidade de Nápoles Federico II e que liderou o estudo, conta que as enguias testadas em laboratório foram colocadas em água com 20 bilionésimos de cocaína por litro – uma concentração residual condizente com a verificada em rios de verdade. Outras enguias, que serviram de referência, ficaram em água pura, sem contaminantes. Após 50 dias de exposição à droga, as narcóticas exibiram sintomas similares aos de uma condição chamada rabdomiólise, em que as fibras musculares se desintegram. Outro problema é que, graças ao aumento da concentração de cortisol, o hormônio do stress, elas pararam de acumular reservas de gordura – que são essenciais para suportar viagens aquáticas longas.

Apesar de qualquer peixe que esteja em risco por causa de contaminação seja motivo de preocupação, as enguias europeias são um caso especialmente delicado porque dependem da capacidade de nadar para fechar seu ciclo reprodutivo e perpetuar a espécie.

Os pesquisadores afirmam que ainda são necessários mais estudos para descobrir o quanto a cocaína realmente afeta as enguias em rios reais, fora do ambiente experimental – e por que a droga é tão nociva para o organismo desses animais em particular. As perspectivas, porém, não são animadoras.

Afinal, além de substâncias ilícitas, a água também tende a estar contaminada com pequenas concentrações de metais pesados, pesticidas e antibióticos.

Enquanto isso, o Departamento de Pesca e Vida Selvagem da Califórnia (EUA) recomendou a inclusão da Marta da Baía de Humboldt (Martes caurina humboldtensis), pequeno mamífero que habita o norte daquele estado e o sul do Oregon, na lista de animais ameaçados, medida vista como a última chance de salvação. O motivo? A indústria da maconha.

A produção de maconha explodiu a partir de 1996, com a liberação do uso medicinal da planta, e vem se intensificando com a liberação do uso recreativo e medicinal em outros estados. A principal produtora de cannabis dos EUA fica numa região conhecida como Triângulo Esmeralda, formado por três condados no norte do estado. É exatamente ali que estão 200 dos 400 indivíduos da espécie, cuja imagem ilustra este artigo.

Para o plantio da maconha, clareiras são abertas no meio das florestas, reduzindo ainda mais o habitat das Martas. A espécie está restrita agora a apenas 5% do território que historicamente ocupou. Apenas no condado de Humboldt a estimativa é que existam entre 4 mil e 15 mil plantações de cannabis em propriedades privadas e áreas públicas ou indígenas invadidas ilegalmente.

Para complicar ainda mais, alguns produtores fazem uso constante de rodenticidas anticoagulantes de forma a afastar ratos e outros roedores que causam prejuízo com a destruição dos sistemas de irrigação. Esses pesticidas altamente tóxicos são inseridos na cadeia alimentar, matando as pragas, mas afetando também seus predadores, como pássaros e mamíferos como a Marta.

Apesar de não existirem estudos específicos sobre a contaminação de martas, uma pesquisa recente sobre duas espécies de corujas, Strix occidentalis e Strix varia , mostraram que de todos os espécimes encontrados mortos, 70% e 40%, respectivamente, apresentavam sinais de contaminação. Entre pequenos mamíferos, 85% dos Pekania pennanti — um parente das Martas — encontrados mortos na Califórnia tinham vestígios de rodenticidas.

 

Fonte: O Globo