Álcool e drogas, o trágico roteiro da paranoia

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Sozinho, desorientado e sob forte efeito de drogas. Foi assim que o catarinense Dealberto Jorge da Silva Júnior, de 35 anos, encontrado morto na madrugada do último domingo no balneário caribenho de Playa del Carmen, no México, foi parar no edifício onde sofreu um acidente fatal ao cair de uma altura de dez metros. Por volta das 23h40 de sábado, o morador de um dos apartamentos do último andar ouviu barulhos e, ao seguir até a janela, visualizou o catarinense debruçado sobre a grade do terceiro andar do prédio, cambaleante. A testemunha, identificada como Richard McCarthy, chegou a sair do apartamento para perguntar ao brasileiro o que ele estava fazendo ali, mas não teve tempo. No caminho até a escada, encontrou outro vizinho que viu Dealberto Júnior caído, já sem vida, sobre uma escada de concreto. Os paramédicos foram chamados, mas não havia o que fazer: ele sofreu traumatismo craniano severo e morreu no local. Este é o roteiro dos momentos finais do brasileiro traçado pelo procurador de Justiça de Quintana Roo, no México, Gaspar Armando García Torres, em documento obtido pelo site da revista VEJA.

Empresário do ramo de engenharia ambiental, Dealberto foi identificado pela polícia porque usava uma pulseira com o nome do hotel onde estava hospedado, o Reina Roja. Quando morreu, porém, houve uma breve confusão porque ele estava com o passaporte do irmão, Luis Fernando da Silva, de 33 anos. Os dois haviam trocado por engano os documentos antes de sair do hotel mais cedo. Ambos estavam em Playa del Carmen com mais dois amigos, Rômulo Savignon e Marília Pompeu Caputo, após acompanharem um casamento em Cancún. Os quatro amigos resolveram esticar a estadia para irem a um festival de música eletrônica na Riviera Maya.

Foi então que teve início um trágico roteiro de paranoia causado pelo uso excessivo de drogas e álcool. Em depoimento, Fernando confirmou à polícia mexicana que ele e o irmão usaram ecstasy, cocaína e álcool. A mistura explosiva já havia sido relatada pela russa Ekaterina Vasileva, de 35 anos, em entrevista ao site de VEJA nesta terça-feira.

Ekaterina, ou simplesmente Katerina, como ela é conhecida, tornou-se uma personagem intrigante do enredo por causa de uma mensagem enviada pelo serviço de comunicação online WhatsApp a um grupo de amigos. Segundo afirmou ao site de VEJA o advogado Juliano Girola, primo dos irmãos Silva escalado pela família como seu porta-voz, a mensagem partiu do celular de Dealberto na sexta-feira, dia 9. A investigação mexicana, no entanto, parece indicar que o recado na verdade partiu de Fernando no dia seguinte, quando todos já estavam sob forte efeito de drogas.

Com fala ofegante e demonstrando extrema tensão, o autor dessa mensagem pedia socorro porque seria sequestrado por uma “amiga do Marchetti, a russa”. Por causa dela, circularam entre amigos dos irmãos em Santa Catarina versões de que Dealberto teria sido jogado do terraço do Hotel Reina Roja porque havia flertado com a mulher de um traficante de drogas ligado à máfia russa.

Dessa trama hollywoodiana, sobrou pouco: de fato, havia uma mulher russa. De fato, havia droga, mas quem abusou dela foram os dois irmãos, segundo mostrou a investigação da polícia mexicana. As consequências foram trágicas.

A bela Ekaterina Vasileva chegou a Cancún na última semana de dezembro acompanhada de um namorado turco que ela conheceu na praia de Ibiza, na Espanha. Porém, no dia 7 de janeiro, os dois brigaram e ela teve de deixar a casa de veraneio que o namorado alugou. Foi aí que Ekaterina pediu a ajuda de um amigo brasileiro, Rodrigo Marchetti, que já atuou como DJ em festas em Ibiza. Marchetti sugeriu que ela procurasse pelos irmãos Dealberto e Fernando, conhecidos dele de Santa Catarina. Após um rápido contato, os dois irmãos toparam hospedá-la no quarto que alugaram no Hotel Reina Roja. O que se sucedeu foi uma sequência de festas — e o uso de entorpecentes que levaram a uma terrível ‘bad trip’.

Todos foram juntos à casa noturna Blue Parrot na tarde de sexta-feira, dia 9. De lá, o grupo se dividiu; Katerina foi com Fernando a uma outra festa, Rômulo e Dealberto seguiram para uma das tantas discoteca do balneário, e Marília saiu com um rapaz que conheceu em uma pizzaria. Na madrugada de sábado, dia 10, o grupo voltou a se reunir, sem a presença de Marília. Saíram pela cidade e ingeriram comprimidos de ecstasy e outras drogas, misturados com doses de vodka e rum.

Quando amanheceu, já no hotel, Fernando brigou com Ekaterina, nas palavras dele mesmo “por razões sem sentido”. Ekaterina enviou uma mensagem a Dealberto informando que havia deixado o hotel Reina Roja — e ele lhe respondeu que deixasse de incomodá-los. Os irmãos então se separaram numa sequência de loucuras: correram sem rumo, sentindo-se perseguidos, e decidiram se esconder em lugares diferentes. Mais tarde, na noite de sábado, voltaram a se encontrar e decidiram se livrar dos celulares, para não serem rastreados por satélite, e de seus sapatos, segundo o depoimento de Fernando, “para não serem identificados” – o que explica o fato de Dealberto estar descalço quando foi achado morto.

Antes de jogar seu celular no lixo, Fernando ainda enviou uma mensagem aos seus familiares na qual falava do temor de ser sequestrado. Conforme declarou às autoridades mexicanas, ele se escondeu em seguida. Do local onde estava, podia observar a movimentação de policiais e pessoas que comentavam sobre uma pessoa encontrada morta. Um sinal de que Fernando andou em círculos e estava a poucos metros do irmão, que por sua vez resolvera escalar um prédio. Aos policiais, Fernando disse ter deduzido que o cadáver de que ouvira falar era do seu irmão. A dedução aumentou sua tensão. Imediatamente, Fernando decidiu comprar roupas e calçados novos, tomou um táxi e pediu que fosse levado até Cancún, onde ficou perambulando sem rumo por dois dias. Quando seu dinheiro acabou, pediu um cartão telefônico emprestado na rua e solicitou ajuda de um amigo.

Por conta da mensagem de áudio que Dealberto postou na internet, suspeitou-se que ele poderia ter se envolvido com uma quadrilha de mafiosos ou narcotraficantes. Às autoridades, porém, Fernando admitiu que nunca houve ameaça de sequestro ou perseguição. E que a paranoia era consequência de um coquetel potente de drogas e álcool na semana de festas no México.

O corpo de Dealberto foi liberado pelas autoridades mexicanas a pedido do próprio irmão e deve chegar a Jaraguá do Sul (SC), onde a família mora, no final de semana. Fernando desembarcará junto.

 

Fonte: site da revista Veja

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