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Deise Benedito tem uma longa trajetória no Movimento Negro, notadamente no feminismo negro onde fundou o Geledés – Instituto da Mulher Negra e presidiu a Fala Preta – Organização de Mulheres negras, além de atuar no campo dos Direitos Humanos, onde se especializou em Política Criminal e Penitenciária.
Deise é referência nacional nestes temas, com participações em seminários, congressos e conferências, tanto nacionais como internacionais. Em entrevista ao site Iniciativa Negra, ela falou sobre como vê a população negra em privação de liberdade na condição de dependente química:
No meu ponto de vista, eu posso destacar que o alcoolismo sempre foi um dos principais problemas da população negra, com traumas terríveis em inúmeros lares, por ser uma “droga” barata e de fácil aquisição, depois as chamadas psicoativas, onde posso elencar a maconha, amplamente também utilizada por escravos de angola, conhecida como Djamba. E, ao entrarmos no uso das anfetaminas, nesta destaco a cocaína, uma droga viciante, e o crack, um dos problemas maiores dos grandes centros urbanos. O uso das drogas tem sido considerado uma das causas da violência. Porém se observamos a situação da população dependente química, em privação de liberdade, na maioria das vezes necessita de tratamento adequado, participação da família, profissionais qualificados, e não internação e ser visto como um “caso de Polícia”.
A relação estabelecida com a população negra é sempre o da garantia da segurança pública não sendo tratado como um problema de (saúde pública). Devo salientar a questão da “Guerra às Drogas”. Em 1971, o então Presidente dos EUA, Richard Nixon, fez um discurso considerado histórico onde declarou: “As drogas são nosso inimigo público numero um”. A partir deste discurso, o modelo intitulado de “Guerra às Drogas” foi amplamente difundido em todo mundo, vendedores de plantas, ou mesmo compostos químicos começaram a ser tratados como “terroristas” e uma ameaça à segurança e à saúde públicas, sendo enquadrados os consumidores e portadores. A tal guerra continua, e deixa um cenário desolador principalmente para a população negra, tanto na condição de usuária ou mesmo na condição de “traficante”.
De Mercadoria no Trafico Transatlântico de Escravos à condição de “traficantes”, e de dependentes químicos, é possível observar, que a população negra e jovem, foi a mais atingida, no que se refere à violência perpetrada pela “guerra as drogas”, que vai da ação dos agentes públicos há guerras entre as facções para o domínio do comercio de drogas nos territórios das grandes cidades. Enfatizo sempre que o Genocídio da Juventude Negra se iniciou no momento do aprisionamento destes jovens na África, ganhando novas formatações, num processo que vai desde o abandono no pós-abolição, e se estende aos dias de hoje, no que se refere às políticas publicas eficazes para sua inclusão social visando o fim das desigualdades provocadas pelo racismo e a discriminação, realizada culminando no encarceramento em massa.
O Genocídio da Juventude Negra, não se dá apenas pelas guerras entre descendentes de traficados, atualmente na condição de traficantes, destaco (Pequenos Traficantes), ou melhor, os (terceirizados no tráfico), mas deve-se levar em conta o impacto das mortes na vida de inúmeras famílias negras, quando não mortos pelos agentes do Estado mortos pelo uso abusivo de drogas. Destaco a sina das mães, irmãs, filhos e as jovens viúvas, que repetiram a triste trajetória de suas tetravós em criar os filhos sozinhas, continuando a ser o arrimo de família e estarem expostas a violência, vivendo em situação de vulnerabilidade extrema, na mira das facções, dos desafetos de seus ex-companheiros mortos na “Guerra às drogas”.
Fonte: Geledés